por David Camargo, Ricardo Erhardt, Werner Schumann
A decisão de ontem do Supremo Tribunal Federal (STF) de derrubar a possibilidade de revisão dos benefícios previdenciários pelo critério da "Revisão da Vida Toda" representa um marco controverso e triste no direito previdenciário brasileiro.
Inicialmente, é fundamental esclarecer o que consiste a "Revisão da Vida Toda" e sua importância para o equilíbrio e a justiça no sistema previdenciário. Essa revisão permitia que segurados do INSS recalculassem o valor de seus benefícios considerando todas as contribuições previdenciárias realizadas ao longo da vida laboral, e não apenas aquelas após julho de 1994, como previsto na regra anterior. Essa medida visava corrigir distorções e garantir benefícios mais justos, especialmente para aqueles que haviam contribuído significativamente em períodos anteriores à implantação do Plano Real.
O Supremo Tribunal Federal, por uma estreita margem de votos, optou por derrubar a "Revisão da Vida Toda". A maioria dos ministros entendeu que a revisão poderia representar uma ameaça à estabilidade econômica do sistema previdenciário, dado o potencial impacto financeiro das revisões. Além disso, argumentou-se que a revisão contrariava os princípios de equidade e de equilíbrio atuarial previstos na legislação previdenciária.
A decisão traz inegáveis implicações negativas para os segurados do INSS, especialmente para aqueles que, ao longo de suas vidas laborais, contribuíram com valores significativos antes de 1994. Destaca-se a perpetuação de injustiças no cálculo dos benefícios e a desconsideração do princípio da integralidade das contribuições. Para o sistema previdenciário, embora se argumente a preservação da sua sustentabilidade financeira, questiona-se a custo de que equidade isso se dá.
No presente artigo manifestamos nosso repudia a decisão do STF, por entender que ela se afasta dos princípios de justiça social e do direito à segurança jurídica e previdenciária dos trabalhadores. A decisão privilegia uma visão restritiva e economicista do sistema previdenciário, em detrimento dos direitos fundamentais dos segurados. Sempre defendemos que soluções alternativas poderiam ser exploradas para equilibrar as necessidades financeiras do sistema com a justiça social, sem que isso implicasse na supressão de direitos.
A decisão levanta ainda questionamentos profundos sobre os valores que norteiam o sistema previdenciário brasileiro e a necessidade de revisitar esses valores, com um foco renovado na justiça social e na proteção dos direitos dos trabalhadores, assegurando que o direito previdenciário cumpra seu papel fundamental de garantir segurança e dignidade aos cidadãos na velhice, em casos de incapacidade e nas situações de vulnerabilidade social. A decisão do STF, ao negar a "Revisão da Vida Toda", implica não apenas em uma perda econômica para muitos segurados, mas também em um recuo no compromisso com a equidade e a justiça social que deve fundamentar todas as ações do Estado, especialmente aquelas que afetam os direitos sociais e previdenciários.
Por fim, a decisão clama por um apelo à comunidade jurídica, aos legisladores e à sociedade civil para que se unam em busca de mecanismos que possam oferecer uma resposta justa e equilibrada às necessidades dos segurados previdenciários, sem comprometer a sustentabilidade do sistema. É imperativo que continuemos a lutar por um sistema previdenciário mais justo e inclusivo, que reconheça a contribuição de todos os trabalhadores ao longo de suas vidas laborais e garanta a eles um benefício condizente com suas expectativas e necessidades, o que buscava a "Revisão da Vida Toda".
Este momento de reflexão e crítica deve servir como um catalisador para reformas previdenciárias futuras, que não apenas corrijam as falhas identificadas pela tentativa de implementação da "Revisão da Vida Toda", mas também fortaleçam o sistema previdenciário contra as ameaças à sua integridade e sustentabilidade. Somente através de um diálogo construtivo e de ações concretas poderemos assegurar que o direito previdenciário brasileiro se mantenha fiel aos seus princípios mais nobres, promovendo a justiça social e protegendo os direitos dos trabalhadores.
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David Camargo, Ricardo Erhardt, Werner Schumann são advogados do escritório DAVID CAMARGO & ADVOGADOS ASSOCIADOS.
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