No último dia 30/06, em sessão virtual, o Plenário do STF retomou e julgou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5322, adotando, por maioria, os termos do voto do relator, Ministro Alexandre de Moraes.
A ação foi ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes (CNTT) e questionava constitucionalidade de diversos dispositivos da Lei Federal nº 13.103/2015, denominada “Lei dos Caminhoneiros”, que tratava do exercício da profissão de motorista profissional e disciplinava a sua jornada de trabalho, bem como o tempo de direção durante a sua jornada de trabalho.
A decisão, que ainda não foi publicada, trouxe importantes mudanças nas regras de trabalho do motorista caminhoneiro.
As principais mudanças abarcam o tempo de espera, tempo de descanso e repouso, assim como suas remunerações, impactando profundamente no custo do serviço de transporte e nas regras trabalhistas a serem observadas e que, com certeza, afetará a sociedade como um todo.
TEMPO DE ESPERA DO MOTORISTA PROFISSIONAL
Com as mudanças trazidas na CLT pela lei 13.103/2015 o tempo de espera era excluído do tempo de trabalho efetivo, o que se depreendia da redação do artigo 235-C § 1º da CLT, abaixo transcrito:
235-C (...) - § 1º Será considerado como trabalho efetivo o tempo em que o motorista empregado estiver à disposição do empregador, excluídos os intervalos para refeição, repouso e descanso e o tempo de espera.
Entretanto, no Julgamento da ADI, o STF considerou inconstitucional a expressão contida no dispositivo e o tempo de espera, devendo o § 1º do artigo 235-C da CLT ter a seguinte redação:
235-C (...) - § 1º Será considerado como trabalho efetivo o tempo em que o motorista empregado estiver à disposição do empregador, excluídos os intervalos para refeição, repouso e descanso.
Também houve reforma no § 8º do artigo 235-C, onde fica claro que o tempo de espera para carga, descarga, fiscalização devem compor a jornada de trabalho.
235-C (...) - § 8º São considerados tempo de espera as horas em que o motorista profissional empregado ficar aguardando carga ou descarga do veículo nas dependências do embarcador ou do destinatário e o período gasto com a fiscalização da mercadoria transportada em barreiras fiscais ou alfandegárias, não sendo computados como jornada de trabalho e nem como horas extraordinárias.
Veja como ficou com a mudança:
235-C (...) - § 8º São considerados tempo de espera as horas em que o motorista profissional empregado ficar aguardando carga ou descarga do veículo nas dependências do embarcador ou do destinatário e o período gasto com a fiscalização da mercadoria transportada em barreiras fiscais ou alfandegárias.
Na prática, isso significa que o tempo que o motorista profissional permanece esperando a carga e descarga, fiscalização de mercadoria, entre outros, passa a ser considerado como tempo à disposição da do empregador, assim, constitui trabalho efetivo para todos os efeitos.
A redação anterior, previa que essas horas de espera que não eram computadas na jornada de trabalho, seriam pagas como indenização ao motorista, na proporção de 30% do salário-hora, sem a incidência de encargos trabalhistas.
§ 9º As horas relativas ao tempo de espera serão indenizadas na proporção de 30% (trinta por cento) do salário-hora normal.
Agora, o § 9º foi julgado totalmente inconstitucional, não sendo mais permitido o pagamento indenizatório das horas de espera.
As movimentações que eram realizadas no veículo durante o tempo de espera, não eram consideradas suficientes para interromper o tempo de espera e gerar remuneração como hora de trabalho.
Com o entendimento firmado no aludido julgamento, perdeu o sentido o § 12º do artigo 235-C da CLT, pois independente de movimentar ou não mercadorias durante o tempo de espera, esse período é considerado como tempo a disposição do empregador e deverá ser remunerado integralmente pela empresa.
235-C - § 12. Durante o tempo de espera, o motorista poderá realizar movimentações necessárias do veículo, as quais não serão consideradas como parte da jornada de trabalho, ficando garantido, porém, o gozo do descanso de 8 (oito) horas ininterruptas aludido no § 3o.
Agora ficou assim:
235-C - § 12. Durante o tempo de espera, o motorista poderá realizar movimentações necessárias do veículo.
O INTERVALO INTERJORNADA
A redação vigente da CLT permitia o fracionamento do intervalo interjornada, ou seja, o intervalo mínimo de 11 horas entre uma jornada e outra, de forma que pudesse coincidir com as paradas havidas durante o trajeto da viajem, respeitando o mínimo de 8 horas de descanso na primeira parada e as horas remanescentes poderiam ser usufruídas dentro das 16 horas seguintes.
Com a decisão do STF não mais é permitido esse fracionamento, ou seja, o intervalo de 11 horas deve ser concedido de uma única vez.
Vejamos como era:
235-C (...) - § 3ºDentro do período de 24 (vinte e quatro) horas, são asseguradas 11 (onze) horas de descanso, sendo facultados o seu fracionamento e a coincidência com os períodos de parada obrigatória na condução do veículo estabelecida pela Lei no 9.503, de 23 de setembro de 1997 - Código de Trânsito Brasileiro, garantidos o mínimo de 8 (oito) horas ininterruptas no primeiro período e o gozo do remanescente dentro das 16 (dezesseis) horas seguintes ao fim do primeiro período.
Com a decisão ficará assim:
235-C (...) - § 3º Dentro do período de 24 (vinte e quatro) horas, são asseguradas 11 (onze) horas de descanso.
O artigo 67-C do CTB, em seu § 3º também teve trecho julgado inconstitucional, onde havia previsão de fracionamento do intervalo interjornada.
Os motoristas profissionais não mais poderão fazer paradas de 8 horas para descanso, e usufruir as horas remanescentes em período posterior, devendo respeitar sempre o mínimo de 11 horas.
Nas viagens com 2 motoristas no mesmo veículo, eram permitido que o repouso ocorresse com o veículo em movimento. Essa prática não mais será permitida pois o dispositivo foi considerado totalmente inconstitucional.
235-D - § 5º Nos casos em que o empregador adotar 2 (dois) motoristas trabalhando no mesmo veículo, o tempo de repouso poderá ser feito com o veículo em movimento, assegurado o repouso mínimo de 6 (seis) horas consecutivas fora do veículo em alojamento externo ou, se na cabine leito, com o veículo estacionado, a cada 72 (setenta e duas) horas. (Inconstitucional)
A mesma situação ocorreu no caso de transporte de passageiros:
235-E (...) - III - nos casos em que o empregador adotar 2 (dois) motoristas no curso da mesma viagem, o descanso poderá ser feito com o veículo em movimento, respeitando-se os horários de jornada de trabalho, assegurado, após 72 (setenta e duas) horas, o repouso em alojamento externo ou, se em poltrona correspondente ao serviço de leito, com o veículo estacionado. (Inconstitucional)
DO DESCANSO SEMANAL
Nas viagens de longa distância com duração superior a 7 dias, era permitido que o descanso semanal remunerado (folga semanal), fosse usufruída quando o motorista retornasse para a empresa ou seu domicílio, salvo se a empresa tivesse estrutura adequada para oferecer esse descanso durante a viagem.
Agora, nas viagens longas não mais é permitido a concessão deste descanso no retorno do motorista, devendo ser concedido durante a viagem, independentemente da condição da empresa.
Antes a redação determinava o seguinte:
Art. 235-D. Nas viagens de longa distância com duração superior a 7 (sete) dias, o repouso semanal será de 24 (vinte e quatro) horas por semana ou fração trabalhada, sem prejuízo do intervalo de repouso diário de 11 (onze) horas, totalizando 35 (trinta e cinco) horas, usufruído no retorno do motorista à base (matriz ou filial) ou ao seu domicílio, salvo se a empresa oferecer condições adequadas para o efetivo gozo do referido repouso.
Com o julgamento, se passa ao seguinte:
Art. 235-D. Nas viagens de longa distância com duração superior a 7 (sete) dias, o repouso semanal será de 24 (vinte e quatro) horas por semana ou fração trabalhada, sem prejuízo do intervalo de repouso diário de 11 (onze) horas, totalizando 35 (trinta e cinco) horas.
Também era permitido o fracionamento do repouso semanal em 2 períodos, sendo 1 com no mínimo 30 horas ininterruptas a ser cumprido após um intervalo interjornada de 11 horas, podendo ser usufruído no retorno da viagem.
O dispositivo foi julgado totalmente inconstitucional, não sendo mais permitido esse tipo de fracionamento.
Art. 235-D - § 1º É permitido o fracionamento do repouso semanal em 2 (dois) períodos, sendo um destes de, no mínimo, 30 (trinta) horas ininterruptas, a serem cumpridos na mesma semana e em continuidade a um período de repouso diário, que deverão ser usufruídos no retorno da viagem. (Totalmente inconstitucional)
Também era permitido nas viagens longas a cumulação de até 3 descansos semanais, e agora não mais é permitido essa prática. Os descansos semanais devem ser usufruídos em cada semana de viagem, sem cumulação.
Art. 235-D -§ 2º A cumulatividade de descansos semanais em viagens de longa distância de que trata o caput fica limitada ao número de 3 (três) descansos consecutivos. (Inconstitucional)
As mudanças decorrentes do julgamento da ADI 5322 certamente refletirão para além das relações laborais com os motoristas, pois acarretam a necessidade de reajustes contratuais, influenciam nos valores e custos de fretes e transportes em todos os nichos do comércio, cujos efeitos poderão alcançar o mercado em geral e, por consequência, chegará ao bolso da população.
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